sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Ameaça sobre o Planalto : auditoria do TCU leva investigação sobre cartões corporativo ao gabinete do presidente e pode provocar CPI

A nova ameaça que ronda o Palácio do Planalto tem a forma de retângulos de plástico e possui uma tarja magnética. São os cartões de crédito chamados de cartões corporativos. A Revista ISTOÉ teve acesso com exclusividade a uma ampla auditoria que o Tribunal de Contas da União (TCU) fez nos 42 cartões corporativos da Presidência da República. Eles servem para cobrir gastos e, principalmente, sacar na boca do caixa dinheiro vivo destinado a custear as despesas do gabinete presidencial, incluindo aquelas realizadas pelo casal Marisa e Lula da Silva e seu staff. A auditoria revelou que, a exemplo do que fizeram os ministros Orlando Silva (Esportes), Matilde Ribeiro (Igualdade Racial) e Altenir Gregolin (Aqüicultura e Pesca), os assessores palacianos também estão usando os cartões de forma fraudulenta. "Foram comprovadas fraudes" na utilização dos cartões, certificou o TCU, depois de três anos de investigação. O relatório final do Tribunal de Contas poderá levar para dentro do gabinete de Lula uma série de denúncias que nos últimos dias têm ficado restritas a ministros de pouca expressão.
Depois de três anos de investigação, o TCU detectou irregularidades como notas frias e superfaturamento

É com base nesses documentos que o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), um dos mais atuantes na CPI dos Correios, pretende conseguir as assinaturas necessárias - 171 na Câmara e 27 no Senado - para instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito a fim de investigar os gastos com os cartões corporativos. "É necessário apurar a utilização indevida e ilegal dos cartões e punir os responsáveis antes que novas irregularidades apareçam. Os números mostram que estão gastando cada vez mais e não apenas nos Ministérios, mas também no Palácio do Planalto", disse o deputado depois de analisar uma série de documentos. Entre as fraudes detectadas na investigação do TCU estão o pagamento de diárias a servidores que não foram indicados pelo Planalto como integrantes de comitivas em viagens oficiais, o pagamento de diárias, muitas vezes superfaturadas, em quantidade superior ao período de estadia efetiva e a inexistência das empresas nos endereços consignados nas notais fiscais utilizadas para atestar o gasto, ou seja, a nota fiscal fria. Há casos ainda de emissão de notas fiscais "calçadas", aquelas que registram valores diferentes nas várias vias de mesmo número.

Quase a totalidade dessas irregularidades, que se repetiram ao longo dos seis anos de governo Lula, foi identificada em viagem presidencial, realizada em 2 de maio de 2003, às cidades de Ribeirão Preto e Sertãozinho (SP). Nessa viagem, foram pagas 22 diárias para pessoas que não constavam na lista de membros da comitiva fornecida pela Secretaria de Administração da Presidência, a um custo total de R$ 3 mil. Também foi pago um número de diárias superior ao período da estadia de seis servidores do Palácio do Planalto. Um desses funcionários, que o TCU identifica apenas como "AT", passou apenas dois dias hospedado em hotel em Ribeirão Preto. Mas o cartão de crédito corporativo pagou o dobro: quatro diárias. O servidor da Presidência identificado como "SJ" também hospedou-se por dois dias, mas passou no cartão cinco. Na ida a Ribeirão dos servidores do Palácio do Planalto, também ficou caracterizado o superfaturamento, segundo os auditores do TCU. O total da despesa da comitiva presidencial com hospedagem no hotel foi orçado em R$ 23,8 mil. O problema, frisaram os auditores, é que o "valor pago pela Secretaria de Administração da Presidência em maio de 2003 superou em R$ 13,6 mil o valor de mercado de hospedagem no mesmo hotel em setembro de 2006". Ou seja, três anos depois. No total, a viagem ao município paulista consumiu R$ 18,1 mil apenas em "despesas irregulares", atesta o TCU. No caso de pagamento de despesas com cartão corporativo, durante a estada em Ribeirão e Sertãozinho, foram identificados indícios de irregularidades fiscais com notas emitidas pelas empresas FR Comércio e Serviços, Nova Era Comércio, Memory House, Comércio Importação e Exportação e Trovata Design Editorial Ltda.

O funcionário designado para custear, com cartão de crédito corporativo, as despesas da viagem às cidades paulistas foi Josafá Fernandes de Araújo. Alçado ao cargo de agente administrativo no governo Lula, Josafá começou a trabalhar no Palácio como datilógrafo até chegar às áreas de licitações e compras durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Ele é apenas um dos 42 servidores do Palácio do Planalto encarregados de suprir todas as necessidades do pre- B R A S I L sidente, de sua família e dos ministros palacianos. São eles os ordenadores de despesas oficiais chamados de ecônomos. Precisam trabalhar com agilidade e compram sem licitação. Muitos chegaram ao Planalto com o presidente, como Roberto Suarez. Outros estão no Planalto há mais de uma década, como Josafá e Anderson Ferreira. As primeiras informações sobre o uso abusivo e indiscriminado dos cartões de crédito corporativos pelo governo foram reveladas por ISTOÉ Dinheiro em reportagem de capa em agosto de 2005. Desde então, as suspeitas de utilização ilegal desse mecanismo sempre foram apontadas pela oposição como a prova inequívoca da diluição da fronteira entre o público e o privado pelo governo petista. O assunto pegou fogo nos últimos dias quando foi noticiado que a ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, gastou R$ 171,5 mil em viagens em 2007, todas pagas com o cartão corporativo.

Nenhum comentário: